quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Parecer da OAB-SP contesta execução administrativa

As propostas do fisco federal, recém entregues ao Congresso Nacional, que tiram do Judiciário boa parte do trabalho de cobrança de dívidas tributárias e não tributárias ganharam, nesta quarta-feira (10/2), a oposição formal dos advogados. A seção da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo entregou ao presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), parecercontestando os quatro projetos de lei que pretendem implantar a execução fiscal administrativa e a transação fiscal. A OAB-SP critica a transferência de patrimônio privado e da Fazenda Pública sem a interferência do Judiciário.

Assinam o parecer os professores Ives Gandra da Silva Martins, da Universidade Mackenzie; André Ramos Tavares, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; e Luis Eduardo Schoueri e Roque Antonio Carrazza, da Universidade de São Paulo. Completam a lista o presidente da seccional paulista da OAB, Luiz Flávio Borges D’Urso, e o presidente da Comissão Especial de Assuntos Tributários da entidade, Walter Carlos Cardoso Henrique.

Tanto poder de fogo tem um objetivo claro: impedir que procuradores de fazendas nacional, estaduais e municipais possam penhorar bens antes do ajuizamento das execuções fiscais, mudança prevista no Projeto de Lei 5.080/2009, um dos quatro projetos similares que tramitam em caráter de urgência na Câmara. Além da proposta, o PL 5.082/2009 e o Projeto de Lei Complementar 469/2009 abrem também a possibilidade de que as dívidas, antes de serem executadas, sejam discutidas em câmaras de arbitragem — uma regulamentação da chamada transação fiscal. Já o PL 5.081/2009 regulamenta o oferecimento de bens em garantia pelos contribuintes devedores, enquanto a cobrança ainda estiver na esfera administrativa. Uma comissão especial foi criada na Câmara no fim do ano passado para estudar os projetos.

A explicação do fisco para a necessidade de mudança é a lentidão do sistema atual, regido pela Lei de Execução Fiscal, a Lei 6.830/1980. “Todo processo, desde o seu início, com a citação do contribuinte, até a sua conclusão, com a arrematação dos bens e satisfação do crédito, é judicial, ou seja, conduzido por um Juiz. Tal sistemática, pela alta dose de formalidade de que se reveste o processo judicial, apresenta-se como um sistema altamente moroso, caro e de baixa eficiência”, diz a explicação de motivos do PL 5.080/2009.

De acordo com o PL 5.080/2009, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ganha o poder de sequestrar bens do contribuinte que não provar ter cumprido com suas obrigações. Um mero ofício expedido por um procurador será suficiente para fazer o que hoje depende de um pedido ao juiz, que defere a constrição somente se não houver outros meios de garantir a cobrança. Dinheiro, imóveis e bens de capital entram na lista — posses que o devedor fica obrigado a relacionar ao fisco ao ter seu débito inscrito em dívida ativa. Um sistema nacional reunirá, conforme o projeto, o cadastro dos bens. O Judiciário só é chamado a atuar na primeira fase nos casos em que não houver bens de fácil acesso. Em todos os outros, as fazendas só são obrigadas a ajuizar a execução 30 dias depois da primeira constrição.

Para os tributaristas, no entanto, a ideia afronta a Constituição. “Não pode haver transferência patrimonial forçada sem o crivo prévio do sempre imparcial e equidistante Poder Judiciário”, dizem. Além disso, uma lei dessa natureza privilegiaria o Estado, que poderia “fazer sua justiça com as próprias mãos, sem a intervenção de um Juiz Natural”.

Os advogados se baseiam nas previsões do artigo 5º da Constituição, que, em seus incisos XXXV e LIV, garante que toda ameaça a um direito possa ser levada à Justiça , e que ninguém será privado de bens ou da liberdade sem um processo legal no qual possa se defender. O parecer também atribui a morosidade nas cobranças via Judiciário à falta de recursos humanos tanto nas procuradorias quanto no Judíciário, o que não justificaria uma modificação no procedimento de execução fiscal.

Inversão de ônus
Outra crítica se refere à inversão do ônus da prova nos casos tributários, que o governo federal pretende enxertar no Código Tributário Nacional. O PLP 469/2009 prevê que o administrador que não provar ter agido com diligência no comando da empresa será responsabilizado subsidiariamente pela dívida fiscal. “Como demonstrar que não se praticou alguma conduta é algo impossível, chega a ser caricata a modificação que se pretende”, dizem os pareceristas.

As ideias não agradam sequer aos procuradores da Fazenda Nacional. Em assembleia organizada em 2008, o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional votou pela rejeição do então anteprojeto apresentado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. O receio dos procuradores é que o excesso de trabalho com as constrições impeça uma arrecadação satisfatória e leve o governo a privatizar as cobranças. “Nosso medo é que esse projeto passe, mas não haja uma estruturação adequada do órgão”, diz Anderson Bittencourt, presidente do Sinprofaz.

Segundo ele, os procuradores não têm condições de fazer o trabalho hoje desempenhado pelos oficiais de Justiça, de visitar os endereços dos devedores e, caso preciso, fazer arrombamentos para penhorar bens. “Paralelamente ao projeto de execução administrativa existe outro, de criação de uma carreira auxiliar à de procurador, a de oficial da Fazenda Pública. Mas como isso depende de concurso público, treinamento e cursos, pode ser deixado de lado pelo Executivo”, afirma.

O temor não é sem motivo. A cobrança de créditos tributários de produtores rurais em valor menor que R$ 10 mil já são incumbência do Banco do Brasil e não de procuradores. A chamada “bancarização”, segundo Bittencourt, pode ser uma consequência da administrativização das penhoras.

Apesar disso, o sindicalista reconhece que a mudança dará agilidade às cobranças. “O procurador substituirá o juiz só em parte, já que qualquer devedor pode recorrer ao Judiciário imediatamente, se tiver bens bloqueados”, explica. “Esse modelo se espelha em experiências de países como Espanha e Estados Unidos, e vai de encontro com o interesse de quem sonega”.

No entanto, Bitencourt não negou que contribuintes que ainda discutam débitos administrativamente tenham bens penhorados. “Falhas podem acontecer, mas a experiência é boa em outros países. Além disso, se todos pagarem, a carga tributária poderá ser menor”, avalia.

Quebra de Sigilo Bancário pela Receita Federal

O Tribunal retomou julgamento de medida cautelar em ação cautelar, em que se pretende a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário, já admitido para esta Corte, no qual se sustenta a inconstitucionalidade das disposições legais que autorizam a requisição e a utilização de informações bancárias pela Receita Federal, diretamente às instituições financeiras, para instauração e instrução de processo administrativo fiscal (Lei Complementar 105/2001, regulamentada pelo Decreto 3.724/2001) — v. Informativos 322, 332 e 335. Após os votos dos Ministros Gilmar Mendes, Presidente, Dias Toffoli e Cármen Lúcia, que acompanhavam a divergência inaugurada pelos Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Britto, no sentido de não referendar a decisão que concedera efeito suspensivo ativo ao recurso extraordinário, e do voto do Min. Ricardo Lewandowski, que seguia o voto do relator, para referendá-la, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie.

FUNRURAL é julgado inconstitucional no STF

Por votação unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quarta-feira (3), a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 8.540/92, que prevê o recolhimento de contribuição para o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural de empregadores, pessoas naturais.

A decisão, que neste caso beneficia os fornecedores de bovinos para abate, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 363852, interposto pelo Frigorífico Mataboi S/A, de Mato Grosso do Sul, e uma subsidiária sua. No recurso, elas contestavam acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que manteve sentença proferida em Mato Grosso do Sul no sentido da constitucionalidade do dispositivo legal impugnado.

Rombo

No mesmo julgamento, o Plenário do STF negou, por maioria, pedido da Advocacia Geral da União (AGU), que atuou em defesa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que a Suprema Corte modulasse os efeitos da decisão, aplicando-a com efeitos ex nunc, ou seja de forma não-retroativa (nesse caso não haveria devolução dos valores recolhidos, que simplesmente deixariam de ser cobrados). A negativa da Suprema Corte abre a possibilidade de outros produtores ajuizarem ações pleiteando o mesmo direito obtido pelo Frigorífico Mataboi S/A.

Era justamente o temor de novas ações – já que o recurso hoje julgado somente beneficia seus autores - que levou o INSS, por intermédio da AGU, a pedir a modulação. O Instituto alegou que haveria risco potencial de uma enxurrada de tais ações provocar um rombo superior a R$ 11 bilhões nas contas da Previdência.

Único voto discordante neste particular, a ministra Ellen Gracie votou pela modulação da decisão, justamente para evitar uma possível enxurrada de ações na Justiça de primeiro grau que, segundo ela, vai de encontro ao esforço em curso para tornar o Judiciário mais ágil.

Além disso, no entender da ministra, a restituição de contribuições ao Funrural, já efetuadas por conta do dispositivo hoje declarado inconstitucional, propiciaria um enriquecimento ilícito, visto que as contribuições recolhidas no passado certamente foram incorporadas pelos produtores aos preços dos seus produtos.

No entanto, o ministro Cezar Peluso, que trouxe o processo de volta ao Plenário, depois de haver pedido vista em novembro de 2006, manifestou opinião em sentido contrário. No entendimento dele, a contribuição ao Funrural representa uma dupla tributação, uma vez que o produtor rural que trabalha em regime familiar, sem empregados, é um segurado especial que já recolhe, por força do artigo 195, parágrafo 8º, uma contribuição sobre o resultado da comercialização de sua produção para ter direito a benefícios previdenciários.

Ademais, no entender dele, o artigo agora declarado inconstitucional representa um desestímulo ao produtor rural, encorajando-o a viver da mera subsistência para fugir da tributação, em vez de dar a sua propriedade uma destinação social, oferecendo emprego e produzindo alimentos para a sociedade.

O caso

No RE, o Frigorífico Mataboi S/A e a empresa comercial do mesmo grupo alegaram que o TRF-1, cujo acórdão contestam, interpretou incorretamente o disposto no artigo 195, inciso I e parágrafos 4º e 8º e no artigo 14, inciso III da Constituição Federal, ao decidir que as empresas deveriam recolher ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) o Funrural sobre a venda dos produtos.

As empresas alegaram, também, que o artigo 1º da Lei 8.540/92 teria criado nova forma de contribuição social sobre a receita bruta decorrente da comercialização da produção rural, ao equiparar “empregadores rurais” a “segurados especiais”. Segundo elas, esta equiparação se restringiria às empresas comerciais, industriais e prestadoras de serviços, não alcançando os empregadores rurais, pessoas naturais.

Argumentaram, além disso, que a norma não poderia ser criada por meio de lei ordinária, mas somente por intermédio de lei complementar.

Para a defesa da Mataboi, a lei atacada, ao considerar receita e faturamento como conceitos equivalentes, promove a bitributação, devido à incidência de PIS/Cofins. Alegam as empresas que o artigo 1º da Lei 8.540/92 fere os princípios constitucionais da isonomia, da capacidade produtiva e da proporcionalidade, pedindo assim, incidentalmente, a declaração de sua inconstitucionalidade.

Desobrigação

A decisão desta quarta-feira, tomada pelo Plenário do STF, que acolheu os argumentos da empresa e de sua subsidiária, desobriga-as da retenção e do recolhimento da contribuição social ou de seu recolhimento por sub-rogação sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural de empregadores pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate.

Esta desobrigação é consequência da declaração de inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII; 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91 (Lei geral da Previdência), com redação atualizada até a Lei 9.528/97, que alterou. A decisão valerá até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98 (que modifica o sistema de previdência social), venha a instituir a contribuição.

A origem do processo está no fato de o Frigorífico Mataboi adquirir bovinos de produtores rurais, pessoas naturais e, nessa condição, acabar figurando como sub-rogado nas obrigações da pessoa física de recolher o tributo.

Iniciado em 2002

O processo deu entrada no STF em novembro de 2002, tendo inicialmente como relator o ministro Maurício Corrêa. Em dezembro de 2003, a relatoria passou para o ministro Marco Aurélio. Levado a julgamento pela primeira vez em novembro de 2005, o ministro Eros Grau pediu vista, depois que o relator havia dado provimento ao recurso.

Em novembro de 2006, o ministro Eros Grau trouxe o processo de volta a julgamento, manifestando-se também por seu provimento. Foi acompanhado pelos votos dos ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Carlos Britto. Mas o julgamento foi interrompido por novo pedido de vista, desta feita, do ministro Cezar Peluso.

Hoje, o ministro levou seu voto-vista ao Plenário, que concluiu o julgamento do processo, dando integral provimento ao RE. Além de Peluso, que acompanhou os votos até então proferidos, deram provimento ao recurso, também, os ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ellen Gracie e o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes.

Súmula vinculante sobre ISS

A Proposta de Súmula Vinculante (PSV) 35, encaminhada pelo ministro Joaquim Barbosa, foi aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde de ontem(4). A proposta do ministro se baseou na decisão do Plenário no Recurso Extraordinário (RE) 116121, entre outros precedentes.

Nesse recurso, o Supremo definiu a não incidência do ISS sobre a locação de bens móveis. O texto da nova súmula foi aprovado por unanimidade dos ministros e tem a seguinte redação: “é inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre operações de locação de bens móveis”.